sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Everything and every moment
is now escaping, cause life
is that eternal and inevitable escape.
Everything escapes, we escape.
People die, we die
and most of the time we don't know what to do.
we're not living 'cause we can't be bothered.
We're walking and moving forward
avoiding to be crushed, to be cursed, to be beggars, to be amputees, to be bitter,
to be embarassed, to be harassed, to be arrested, to be poor, to be killed.
and that (funny thing) kills us all.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Que o Natal existe, todo mundo é triste, lá lá lá lá....

Tentei fugir daquele Natal falso de qualquer maneira. Já tinha conseguido ignorar a madrugada do dia 24 com gin +tônica, a hidropônica e uma pilha de CDs que todo dia eu arrumava e destruía. Mandei toda sorte de bons pensamentos para a minha família, bem rápido, pra não pensar demais neles. Era muito longe. Eu estava há quase um ano na Austrália e preferia fingir que nada estava acontecendo do que ter que fingir o contentamento miserável de almoçar com aqueles estranhos mais estranhos do que os que moravam comigo. Almoço miserável. Amigo secreto mais miserável ainda. Na verdade, no fundo, acho que nem eles queriam aquilo. Ou queriam, vai saber. Ou não queriam e nem sabiam disso, como bons brasileiros. Coisa de brasileiro chato e eu acordada-sem quase dormir desde às oito da manhã, com taquicardia da ressaca, com medo de estar doente, com medo de ter que ir embora pro Brasil, com medo de decidir ficar, com medo de nada acontecer como nunca acontece em lugar algum, como era sempre comigo.

Tomei um australian breakfast, egg on a toast e uma xícara de café forte demais pra mim, troquei de roupa e sentei sozinha na sala fumando aquele lixo de Peter Jackson e esperando alguma coisa, alguém chegar ou uma boa história que justificasse minha ausência no circo de natal, de preferência com requintes de pena (se eu estivesse com uma doença desconhecida ninguém ia me julgar). A mentira é mais bem quista do que o desejo genuíno de não estar com as pessoas.
Meus flatmates acordaram e nem bem trocamos todos os bom dias, chegaram todos de uma vez. Era o mundo do almoço mais longo do mundo começando todo de uma vez.
Eu estava na minha casa e nunca tinha me sentido mais desconfortável (é claro que já). Não sabia onde sentar, com quem falar, como descreveria meu amigo secreto desconhecido e forçado. Então, quer saber? Resolvi relaxar e pouco me foder enquanto as coisas não piorassem, porque eu sentia que elas iam piorar.
Foi aí que chegou o Fernando. 
Fernando era um dos meus flatmates, era a pessoa que tinha pegado todos os móveis no lixo pra montar a casa. Ele tinha um orgulho imenso disso, de como ele havia conseguido a geladeira, a máquina de lavar e secar roupas, a torradeira, as camas, o conjunto de sofás, o banco de carro-poltrona, que era arte moderna na cabeça dele, e a cabeça de boneca com bandana da bandeira do brasil, que ficava no centro da sala. Eu sei. 
O Fernando falava um inglês precário, mas era uma pessoa esforçada o bastante pra arrumar uma menina apaixonada pra ser sua namorada a cada teste de Cambridge, ou até suas provas na escola. Era o típico 171. Em Santo André, de onde ele era, vivia de trapicolagens como vender consórcios de carro duvidosos e empurrar books para mocinhas menos graciosas que se sentiam lisongeadas ao serem abordadas pelo "booker". Ele já tinha tido vários trabalhos na Austrália e era uma maravilha quando ele trabalhava em restaurantes e trazia comida pra caralho pra nós, queridos flatmates. Na época do circo- almoço ele estava trabalhando como garçom do indiano e bouncer numa boate de quinta. Ele quase não tinha tempo pra dormir e por isso começou a usar speed, cada vez mais e mais. 
Era mais de meio dia quando o Fernando chegou direto da boate, virado de semanas de trabalho, com a expressão mais longíqua e insana no rosto e com um turco pouco amigável de dois metros a tira-colo. Merry Cirquemas.
- Rááááááá! Gente, não sabia que vocês todos iam estar aqui pra me receber do trabalho... Nossa, a gente pensa que os dias são todos iguais, mas não são, cara... não são... Olha vocês, aqui, do nada...
   cri, cri, cri...
A Marina, uma das minhas melhores amigas de Ribeirão, que também estava morando na Austrália por uma série de coincidências legais mas isso é outra história, começou a rir de estranhamento, ou pra deixar claro que era piada. Não colou muito, eu acho.
O pessoal ficou todo conversando e bebericando na sala, o turco se postou na poltrona- banco de carro e eu e a Marina puxamos o Fernando pro quarto. Nem eu nem ela sabíamos como começar a perguntar o que estava acontecendo. 
- Meninas, por favor... Tô fudido.
-...
- Esse turco que tá aí, tava lá na boate, eu trouxe ele pra cá.
-...
- É que eu tava na boate e um pessoal começou a me dar speed, eu achei que era pra eu não dedurar pro gerente que eles tavam todos cheirando, mas não era, não era de graça, tô devendo grana pro turco aí...
Pronto. Meu medo de que nada nunca ia acontecer foi prontamente substituído pelo meu medo do turco. 
- Ué... Dá a grana pra ele que ele vai embora! Você tá devendo muito? A gente faz uma vaquinha e te empresta, sei lá, Fernando, resolve aí...
Quando parei de falar percebi que o Fernando não tinha ouvido nada do que eu dizia.  Ele estava olhando o pôster do poderoso Chefão na parede, com um sorriso triste numa expressão congelada e um riozinho de lágrimas caindo de um olho só. Saiu do quarto com essa cara direto pra sala. Saímos atrás. 
O movimento do pessoal, que bebia e comia foi se voltando pra ele, que chegava na sala devagar. Todos pararam o que faziam e olharam pro Fernando. Todos sorrindo, esperando algo. E os sorrisos foram se apagando e curiosamente se assemelhando ao sorriso químico dele. Ele não dizia nada, até que disse. 
- Vô, porque você me disse aquilo antes de morrer? Eu mereci? 
E o riozinho correndo de um olho só.
O fim do almoço chegou muito rápido depois disso. O amigo secreto vôou e nem me lembro o que dei ou ganhei de presente. O Fernando, ao abrir o presente da Ariane, um brinco de argolinha, já se pôs a dizer, quase sem respirar, que jamais se casaria com ela. Ele e a Ariane tinham tido um casinho infrutífero logo que se conheceram. Ele achou que o brinco fosse uma aliança. Depois de mais alguns risinhos infelizes todos foram embora. Menos o turco.
O turco dormiu durante todo o almoço, o amigo secreto e o desconforto de todos, na mesma banco de carro-poltrona. Quando todos se foram ele acordou. Perguntei quanto o Fernando devia a ele pelo Speed. Nada, ele disse. O speed pro Fernando era de graça mesmo. Ele só queria um lugar para passar o Natal.



terça-feira, 8 de julho de 2008

Soft Color Granada

Todo dia antes de começar a aula era assim, a névoa da madrugada escolar, o pátio semi vazio, os nerds babando e empurrando o grande aro de ferro e brinquedo, os metidos a atletas profissionais dando o sangue no bola ao mastro pra entrar na classe com bigodinho nojento de suor, alguns tomando o café- da- manhã na cantina sem variedade e outros sonolentos esperando os amigos chegarem e observando no prédio do outro lado do pátio os alunos mais velhos, que estavam mais próximos de abandonar aquilo tudo. Pra trocar por mais daquilo, mas ninguém sabia disso ainda.

Foi num tédio desses que descobri minha "ídola" não- famosa, que estudava ali mesmo na escola. A Jackie tinha, além de um apelido em inglês, um cabelo tingido de vermelho- alaranjado em chamas e usava as melhores roupas de toda a escola. De repente ela cruza o pátio com uma camiseta oversized e na época já vintage da Madonna, do The Girlie Show, calça jeans justa e detonada e havaianas. Pronto. A Jackie trend setter estava criada. Ela tinha só 18 anos, mas na minha cabeça era a Vivienne Westwood.
Desde criança eu me amaldiçoava por não ter nascido com um cabelo vermelho berrante; eu tinha inveja da pequena sereia, comprava bonecas ruivas e a minha Barbie mais inseparável era a Vicky, uma ruiva de cabelo na cintura. Tudo só piorou quando li/ assisti Christiane F. Eu tinha treze como a própria e queria um cabelo daquele de qualquer jeito, mas minha mãe não me  deixava enfrentar uma descoloração, "só xampuzinho, e olhe lá". Fair Enough. Aceitei a ordem. Mas o resultado era muito sutil pro meu gosto. Na época eu já gostava de rock e tinha adotado um visual menos convencional.
Na realidade, vi a Jackie poucas vezes depois disso, algumas vezes na boate, onde conseguíamos entrar com salto alto, maquiagem e cigarrinho na mão, em alguns bares e nas festas do colegial, que eram feitas em boates desativadas. Ela estava sempre dançando super bem. Um dia, numa festa de fim de ano da escola, eu a vi se apresentando com uma companhia de ballet e uma novidade: cabelo curtinho e verde escuro. E um piercing no nariz, numa época em que nem existiam body piercers em Ribeirão. Todo mundo queria saber como era tudo aquilo e ouvi de relance no banheiro, enquanto eu e minha melhor amiga fumávamos escondido (mais pela adrenalina que pelo vício inexistente), ela explicando para as amigas o que era aço cirúrgico. Foi a penúltima vez que eu a vi, e apesar dela ser a coadjuvante desse meu post (sim, porque a principal sou eu), ela não teve nenhum impacto na minha vida, daqueles que os ídolos colegiais têm. Isso, claro, até a última vez em que eu a vi.
Eu estava num bar ridículo e pretensioso, que se orgulhava de servir café à noite e onde garçons queriam que a gente degustasse o vinho almadém antes de beber, mostrando a rolha. Triste. A banda de blues que tocava era a única do gênero na cidade e tinha o repertório congelado há uns cinco anos. As cadeiras eram frágeis e minha amiga Amanda quebrou uma delas.  Todo mundo riu, porque ela era gordinha, e ela riu muito também, o que mostra que ela ficou bem triste.
Foi lá que eu vi a Jackie, agora Tatiana a contra gosto. Ela usava uma calça jeans baixa com um top de crochê marrom horrível. O cabelo estava castanho esverdeado, daqueles que escondem um louro platinado por baixo. E ela parecia tão velha, apesar de ter uns 25. Estava bêbada e sozinha, dançando eroticamente frente à banda, que ficou visivelmente constrangida. No final de cada música/dança, ela olhava para todos os lados e sorria para as pessoas das mesas, esperando a saudação de seu ato, os aplausos que nunca viriam. Assim ela passou a noite toda, cada vez mais bêbada, mais vulgar e mais triste. Pensei em sonhos destruídos e fiquei com muito medo.
Usei meu cabelo vermelho em chamas por quatro anos, depois cansei.